Planos

Vou comprar uma moto. Dessas que tem mais lataria que meu carro, com guidom seca-suvaco e um ronco lascivo; vou mantê-la sempre tinindo e brilhante, para quando eu despontar lá no horizonte da estrada, todo mundo pensar que é uma estrela que desceu e resolveu correr com os carros e caminhões. Vou sim. O problema não é arranjar dinheiro, afinal isso é fácil, assalta-se um banco, dá um golpe aqui, tropeça num shopping e leva isso pra justiça; a parada é arranjar coragem. Porque o dia que eu tiver a minha bichinha, eu vou sumir. Vou olhar para uma faixa no asfalto e vou seguí-la para descobrir onde vai dar. Ah, vai ser fera! Vou viver de calça jeans, botas pretas com aqueles saltos que só as strippers usam, sempre com uma trança na cabeça coroada por uma bandana surrada, que só de olhar, as pessoas já pensam que ela tem mais história para contar que eu, sem esquecer das minhas 9 tatuagens! Aí, pronto, eu viro uma lenda urbana. Pulando de cidade em cidade, sem que ninguém saiba o meu nome, fazendo gestos nobres, salvando crianças dos corregos cheios, doando minhas tranças para os hospitias fazerem sutura, reunindo filhos separados dos pais, entregando remédio e comida pros doentes e ajudando nos mutirões pra colheita e pra construção. E como apareci, vou sumir, sem deixar nome ou fotos para trás. A única evidência de que passei por lá, além dos sorrisos do povo ao contar as histórias, vão ser as minhas inciais no primeiro lugar das máquinas de pinball da cidade.