quarta-feira, maio 09, 2012

Mitos modernos

Quando eu era adolescente, meu irmão era um ávido leitor de quadrinhos. Eu consegui passar anos de certa forma inoxidável ao seu vício, conhecia alguns personagens, admirava algumas ilustrações, mas só passei a tê-lo de verdade depois de velha crescida, com um namorado que tive, e o porquê foi bem simples. Primeiro, foi só então que percebi a grandeza da arte sequencial, sobretudo pela mão de alguns artistas brilhantes, como Eisner e Miller, coisa sobre a qual já falei aqui; em segundo, eu fui apresentada às graphic novels. Ideal pra mim que não sou fã de ficar indo todo mês à banca pra saber qual foi a última coisa que um sujeito que nasceu na década de 50 fez. Além do mais, sou mais inclinada aos temas sérios – e tomo o sentido que o próprio mestre Eisner deu a esta palavra ao falar de quadrinhos – como a cidade e a forma em que ela foi construída através dos anos e das pessoas, ou até mesmo um herói que estimule-nos e desperte-nos à revolução, que é o caso de V de Vingança.
Mas ainda assim, eu sou ávida defensora de Superman e seus colegas de... alter-ego, tanto pelo seu valor literário quanto pelo seu valor histórico. Pensem comigo, se quisermos explicar para alguém como se dá a saga do herói, coisa que eu estudei na faculdade de Letras, dentro da cadeira de Mitologia, podemos até falar de Aquiles ou Zeus, mas só vamos trazer isto definitivamente para o universo palpável da pessoa ao citarmos Batman. Está tudo lá, o abandono pelo qual a criança passa e sobrevive, que é a sua própria vitória diante da morte, o seu guia e tutor, a sua hybris, e a sua derradeira conversão em herói, quando se alia àquilo que considera mais terrível. Assim como Perseu se aliou à cabeça da Medusa, Bruce Wayne se aliou aos morcegos que o assustaram quando caiu naquele buraco em sua infância. E nada se esgota aí. Eu gosto muito de olhar para Bruce Banner e pensá-lo como um Dr. Jekyll que deu certo, porque se aliou com o seu lado negro, isto é, sua força bruta e irracional, para então se tornar o herói Hulk.
Do ponto de vista histórico, é interessante observarmos as cores da maior parte dos uniformes, como o azul, branco e vermelho imperam. Os dois maiores selos do mundo HQ podem apresentar uma palheta variada nos tons dos colants, mas não vão querer escapar muito das cores da bandeira estadunidense, e isto não é à toa. Como também não é coincidência ver nos recentes filmes com os heróis, momentos em que a solidariedade e a união civil se fazem presente. Apesar de só ter visto os filmes do Homem-Aranha com o Tobby McGuire uma vez – e bastou – eu lembro bem dessas cenas. O recém-lançado Vingadores também tem sua pitada.
Eu, assim como várias outras pessoas, incluindo aí muitos brasileiros, tenho minhas discordâncias com os Estados Unidos e todas as políticas circunscritas na cultura. Sinceramente, não vejo isso de todo mal, acho uma reação ao imperialismo norte-americano, necessário pra todo mundo, para que todos olhemos pra dentro do nosso próprio país e saibamos ver o nosso próprio valor. Não raras vezes ouvi críticas duras sobre o Capitão América. Não, não é meu favorito. Mas acho extremamente importante entender o momento de seu nascimento. Sua primeira aparição foi em março de 1941, numa revista só sua. Seu inimigo se chamava Caveira Vermelha. Ok, a guerra, pelo menos a Segunda, já acabou há muito tempo, e ninguém mais pensa nos russos como o problema. Por isso que o Tony Stark, pelo sempre adorável Robert Downey Jr., foi prisioneiro de palestinos.
Sim, discordo de muita coisa da cultura do Tio Sam, mas quando li este texto, algumas tiveram que ser friamente pensadas. As pessoas podem criticar o Capitão América o quanto quiserem, mas em mim ele causa, de verdade, inveja. Inveja de que no meu país não cola esta imagem de herói forte, destemido, corajoso e de bom coração que carrega as cores e a estrela de um país no peito. Cola Macunaíma, Jeca Tatú, personagens das quais eu entendo o valor e crítica social, importantíssimos, mas são apenas anti-heróis. Até mesmo quando Walt Disney quis "deixar um presente pro povo brasileiro", fez uma personagem malandra e preguiçosa.
A gente pode ser crítico, e temos que ser. Só assim para tornarmos o nosso país aquilo que precisamos que ele seja pra uma nação, independente de que lado do globo o sujeito que lê a frase esteja. Mas se não tivermos amor ao nosso país ao olharmos pra ele, sempre será a nação de outrem, nunca nossa.

Nenhum comentário: