quarta-feira, setembro 19, 2007

Metrópole - parte 3

—E esse tempo não abre?
Reclamou às núvens como quem espera ser atendido. Descolava a camisa molhada do corpo enquanto se chacoalhava numa tentativa inútil de se secar.
Estava sozinho, sem as prestativas e adestradas secretárias. Onde teria uma toalha seca? Talvez no mesmo armário com o jaleco e os aventais.
Não.
Pingava por todo o piso do prórpio consultório sem sucesso. Jogou-se na sala de espera, definitvamente mau-humorado. Puxou o celular para saber quando uma delas chegaria; era uma emergência, afinal.
Sem resposta.
Primeira vez em dias que se sentava sozinho, sem família, funcionárias ou pacientes. Puxou do bolso o bilhete, releu as frases finais, não sou uma doença para você tratar, e nunca serei a sua esposa para ter seu respeito. Acabou. Respirou fundo sem reagir. Pensou "mal sabe ela que mal sei tratar uma doença".
Levantou-se secando o rosto, fingindo para si mesmo que aquela nova gota correndo no rosto, mesmo ali fechado, ainda era da chuva.
Ligou o rádio, já tivera mais silêncio do que precisava.
Parou diante da parede vazia enquanto aquela música pretensiosa e cafona, típica de consultórios, cobria parte do som da chuva; as mãos pousadas na cintura gorda. Concentrou-se na sensação provocada pelas gotas que corriam pela cabeça calva, causando arrepio; mas naquele momento pareciam nada.
Trovão.
Breu. Deveria ser algum disjuntor.

2 comentários:

xistosa, josé torres disse...

É! Há sempre alguns, (ou muitos assim).
Eu costumo dizer que os médicos curam, por "apalpação".
Apalpam aqui, ali, acolá e têm que acertar ... se não for na vida, acertam na morte.
Aqui, em Portugal, são os únicos que ficam impunes com a morte que provocam!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.