domingo, fevereiro 03, 2008

Sobre papel e energia

Antes mesmo da papelada, do arrasta-arrasta, ou da minha imensa perda, essa idéia já havia me assaltado. Ele passou à frente, bateu as teclas dele sobre o assunto. Mas tanto tempo ruminando, a gente termina ignorando o risco de se tornar repetitivo.
Eu olho o meu baú de recordações (sempre o chamei assim, depois de anos ocupando várias formas diferentes, ele permanece como uma gaveta), com cartas, cartões, papéis de bala, fitas, bilhetinho de aula, desenhos bobos, fotos, e penso que hoje o fluxo de coisas que ali entram é tão menor do que há 10 anos. Eu me pergunto o que será das gerações futuras que as recordações se resumirão a bytes, que podem ser formatados, e apagados com a mesma facilidade de se chamar um elevador. ( No meu baú, a regra sempre foi o que entra não sai.) O volume de coisas, bilhetinhos, lembretes que as pessoas escrevem hoje é infinitamente maior do que no passado, isso lá é, mas via scrap, por regra, o que é lido é apagado; seus e-mails ficam armazenados em algum lugar que sempre é passível de sofrer um erro fatal (naturalmente que este adjetivo foi despido de seu verdadeiro sentido) e ser perdido.
Quem somos nós sem as lembraças e recordações daquilo que vivemos?
Ainda que as fotos do seu casamento terminem em um CD, pen drive ou qualquer mídia-ultra-micro-moderna, em um futuro (próximo), você não terá mais o driver para lê-la.
Mas eu penso que o problema passe por uma diferença ainda mais sutil. Os álbuns ocupam a estante, há um ponto em nossa casa destinados a ele; cedo ou tarde, na hora de se tirar o pó, cruzaremos; quando precisamos, eles estão ao alcance de nossas mãos. E isso um CD, um chip, nunca vai te dar. O que se passou é mais uma lâmina, como outra qualquer, que necessita de um aparato imenso, com a versão certa e atualizada para poder ser revisitada.
Talvez o que mais me assuste com o passar do tempo e da modernização é que precisamos cada vez mais de energia elétrica para saber quem somos nós e nossos amigos, como podemos achá-los, como vivemos, qual é a nossa cidade e o que ocorre dentro dela. Preciso até mesmo para poder ter papel para escrever.

2 comentários:

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Lois Lane disse...

O que mais me deixa triste nisso tudo é que os comentários em um blog se vão. Eles desaparecem! Várias observções mordazes, discussões filosóficas e porradarias verbais se perderam para sempre. E quem disse que meus netinhos vão acreditar quando eu contar para eles o que me disseram em priscas eras?