sexta-feira, outubro 02, 2009

In vino veritas

Chato-pai me deixou um recado de mais de um minuto na secretária eletrônica, começou com suas piadinhas de costume, que eu adoro, e logo desbancou em tom mais grave falando que a arte é inútil, cuja única função é confortar; não sendo a obra ou o produto artístico, mas sim o o momento do fazer-artístico. Disse também que é mecanismo para que se estabeleça o padrão.


Hmmmm


Não sabia que meu pai andava lendo Oscar Wilde, ele mesmo declarou não haver nada mais inútil. Mas de acordo com o que ele mesmo escrevia, aquilo que ele dizia não era para ser levado tão a sério, vide lord Henry Wotton (personagem, aliás, que eu adoro). Quanto ao conforto do fazer-artístico, eu perdôo, Chato-pai é engenheiro, acha que fazer arte é mole, relaxante e fácil. Às vezes não há mais inqüietante do que a criação, nem mesmo do que a contemplação do objeto.
Sobre padrão, nada foge a isso, trata-se de uma propriedade da condição humana, tudo que fazemos está sujeito a um padrão e é a tentativa do estabelecimento deste padrão.
Mas o que eu acho mesmo, e disse-lhe isso, que a arte é o que nos separa dos animais sem anular nossa condição animalesca, mais ou menos como aquela frase maravilhosa do Millor, "O homem é o único animal que ri e é rindo que ele mostra o animal que realmente é". E é interessante observar como o homem é um fenômeno artístico, assim como linguístico e religioso. Nunca houve um sociedade sem uma língua, uma religião ou uma forma artísitca. E, em geral, estas três coisas estão relacionadas entre si, e definem a existência de seus criadores, trata-se da alma de um um povo e da compreensão dele sobre ele mesmo.
Por outro lado, Chato-pai, para mim nada é mais inútil do que vinho, que, ao contrário da arte, é exclusivamente elitista, e ainda mais quando é o motivo para o Renato Maischato ficar falando sem parar e as pessoas quererem fazer cara de inteligente ao ouví-lo.
— Este vinho é pretencioso, com um quê de Provence antiga sob a chuva.
Ah, vai!

2 comentários:

lulu! disse...

hummm, achei bem bonita sua análise sobre a arte. porém, como ainda estou sob o impacto do "yes, we créu" e acabo de ver exemplos magníficos de "antearte" ou "antiarte", whatever (ambos têm cabimento, na vdd), na tv aberta, estou um tanto quanto mal humorada com a balbúrdia que as pessoas promovem neste mundo de Deus e, é uma pena, mas os conceitos do post parecem deveras utópicos para a maior parte da população.
tenho, ainda, de discordar de vc em dois pontos:
"O homem é o único animal que ri e é rindo que ele mostra o animal que realmente é" - não é, não!!! inclusive, no orkut de uma miga mesmo (desconfia quem seja?!) existem justificativas exemplificativas em foto.
"para mim nada é mais inútil do que vinho, que, ao contrário da arte, é exclusivamente elitista" - nananinanão. na própria vizinha hermana argentina é possível encontrar vinho sendo vendido em embalagens de papelão no supermercado, a preço popular, para populares, como nosotros.
*última coisa: qqer coisa chamada de arte deve ser considerada arte de fato?

Ricardo Artur disse...

Nossa, essa postagem rompe com uma linha de episódios envolvendo o Chato-pai.
Mesmo assim a discussão é boa.

Como designer, ou seja, aquele cara que fica entre a engenharia e a arte, só acho pertinente questionar a idéia de utilidade do chato-pai.

Bem da verdade, quase todas as coisas que a humanidade cria são inúteis! Já que ele é engenheiro, pergunte sobre a utilidade de se construir uma estação espacial, ou qualquer outro aprimoramento de tecnologia.

Acredito que já na pré-história com a descoberta do fogo e o desenvolvimento das ferramentas essenciais para a sobrevivência e da linguagem, o ser humano já tinha tudo o que era necessário. O resto é bem inútil, mas certamente indispensável. Como um bom vinho!